A Corte Interamericana de Direitos Humanos emitiu um parecer consultivo reconhecendo que enfrentar a emergência climática é uma obrigação dos países, configurando-se como um direito internacional. Essa decisão deve servir como base para orientar tribunais em litígios relacionados ao tema, especialmente nos países signatários da Convenção Interamericana dos Direitos Humanos, incluindo o Brasil.
De acordo com Romina Picolotti, fundadora da organização sem fins lucrativos Center for Human Rights and Environment, essa nova orientação pode resultar em um aumento no número de litígios sobre mudanças climáticas, especialmente envolvendo Estados. “Há uma responsabilidade muito importante aqui, e isso poderia gerar uma série de ações judiciais e administrativas. Um pedido ao Poder Legislativo para aderir a uma legislação não regressiva é um exemplo do que pode ser feito”, afirma Picolotti.
Ela enfatiza que todos os atores do Estado, não apenas o Poder Judiciário, precisam alinhar suas ações às obrigações estabelecidas pela Convenção Interamericana e outros tratados de direitos humanos. Mudanças na política pública ou na legislação ambiental que agravem a emergência climática poderão ser interpretadas juridicamente como violações dos direitos humanos.
O relatório Tendências Globais em Litígios sobre Mudanças Climáticas: Panorama de 2025, publicado pela London School of Economics, revela que o número de litígios climáticos tem crescido anualmente em 60 países, incluindo o Brasil. Desde 1986, foram registrados 2.967 processos, e apenas em 2024, surgiram 226 novos casos relacionados às mudanças climáticas.
O estudo mostra que 80% dos processos que chegam a cortes superiores são movidos contra o Estado, mas os casos que mais frequentemente são julgados procedentes envolvem empresas. O Brasil se destaca como o quarto país com o maior número de litígios climáticos, totalizando 131 casos até o final de 2024, a maioria buscando compensações por danos ambientais, como o desmatamento.
Picolotti aponta que o aumento desses litígios demanda a criação de novas orientações jurídicas, marcos legais e capacitação dos sistemas judiciários dos países. “O litígio climático é um processo de interesse público que busca resolver uma situação de emergência. Nunca antes tribunais e a humanidade enfrentaram um desafio desta magnitude, por isso é necessário adaptar e modernizar o arcabouço jurídico para proporcionar justiça climática”, explica.
A construção do parecer consultivo foi resultado de intensa participação social, com sete dias de audiências públicas em cidades como Brasília e Manaus, envolvendo mais de 150 intervenções orais. A contribuição veio de 36 Estados, 17 povos indígenas, mais de 90 ONGs, 70 instituições acadêmicas e 45 especialistas, totalizando 260 memoriais escritos de toda a América.