Presidente do TCE envia nota onde diz que CF-88 veda anonimato

Apesar da versão do presidente do TCE, isso não é o entendimento dos aplicadores da lei

Por José Ribas Neto,

Em matéria publicada ontem no Portal AZ se revelou que denúncias feitas ao Tribunal de Contas do Piauí (TCE-PI) tem exigido documentos com foto aos denunciantes.

O presidente do TCE, Kennedy Barros enviou nota ao AZ onde afirma que a Constituição Federal veda o anonimato.

Veja nota: 

“Em resposta à matéria “Burocracia do TCE-PI desestimula denúncias e expõe denunciantes”, o Tribunal de Contas do Estado do Piauí – TCE-PI vem, através da presente nota, apresentar esclarecimentos pertinentes à matéria, em especial no que diz respeito à distinção entre processo formal de denúncia (que não aceita manifestações anônimas) e comunicações de irregularidade (que aceita manifestações anônimas).

Foto: Reprodução/TCEKennedy Barros e sua decisão que só é perfumaria.  Não resolve nada do caos que está instalado na gestão municipal
Kennedy Barros 

A matéria inicia informando que “A Ouvidoria do Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) tem exigido que cidadãos que queiram fazer uma denúncia forneçam documentos pessoais, incluindo uma cópia de um documento oficial com foto. 
Essa exigência, prevista no Regimento Interno do TCE-PI, levanta questionamentos sobre a proteção do anonimato dos denunciantes e o acesso da população mais humilde ao sistema de controle externo.”

Primeiramente, destaca-se que a Constituição Federal de 1988 prevê, em seu art. 5º, inciso IV, que “é livre a manifestação de pensamento, sendo vedado o anonimato”. Em atendimento a tal direito fundamental, existem reiterados julgamentos dos Tribunais Superiores no sentido de que não é aceitável a aplicação de sanções baseadas apenas em denúncias anônimas, sendo necessária a devida fundamentação dos fatos e direitos alegados e, além disso, ainda que seja mantido o sigilo do denunciante durante todo o curso do processo, o sigilo quanto à autoria da denúncia deverá ser retirado após o trânsito em julgado da matéria. Maiores informações quanto a esse aspecto podem ser consultadas, por exemplo, nos autos do Mandado de Segurança n. 24.405/DF, Relator Ministro Carlos Velloso, Plenário, DJ 23.4.2004.
Em razão do exposto, e em atendimento às Constituições Federal e Estadual, a Lei Orgânica do Tribunal (Lei Estadual nº 5.888/2009) descreve, em seu art. 96, parágrafo 1º, que “A denúncia sobre matéria de competência do Tribunal deverá referir-se a administrador ou responsável sujeito à sua jurisdição e, sempre que possível, ser redigida em linguagem clara e objetiva, estar acompanhada de indício de prova, e conter o nome legível, a assinatura do denunciante, sua qualificação e endereço”.
A denúncia formal deverá ser encaminhada pelo sistema eProcesso e, uma vez preenchidos os requisitos do art. 96, §1º (que foram reforçados no art. 226 do Regimento Interno do TCE-PI), o processo será admitido, e seguirá o devido rito até seu julgamento ao final, ocasião em que o denunciado poderá receber punições do Tribunal (multa, afastamento de cargo público, entre outras).
Caso fossem aceitos processos formais de denúncia baseados exclusivamente em manifestações anônimas, eventuais punições aplicadas pelo TCE poderiam ser questionadas judicialmente. Por isso, não é aceitável que se dê início a processo de denúncia tomando-se por base exclusivamente manifestações anônimas.
Entretanto, o TCE-PI tem total interesse em receber informações que possam contribuir com suas ações de fiscalização, e entende que, em muitos casos, eventuais interessados em comunicar irregularidades têm receio de se identificarem, por diversas razões. A fim de viabilizar o recebimento dessas informações, a Ouvidoria do Tribunal disponibiliza canais virtuais, telefônicos e presenciais para recebimento de comunicações de irregularidade.
Diferentemente das denúncias formais, que devem ser recebidas de acordo com a legislação acima, as comunicações de irregularidade não dão início a processo de fiscalização no Tribunal, sendo consideradas inicialmente apenas uma fonte de informação adicional que poderá, ou não, ser utilizada em fiscalizações. Por essa razão, as comunicações podem ser enviadas por qualquer pessoa, ainda que de forma anônima e sem evidências ou indícios de provas mais específicos, sendo suficiente para seu recebimento a mensagem que o manifestante deseja transmitir.
Apesar de não dar início a processo, o teor das comunicações de irregularidade é aproveitado nas ações de fiscalização do Tribunal. Não são raros os casos em que a ação do Tribunal se inicia a partir de comunicados recebidos na Ouvidoria, podendo inclusive levar à suspensão ou correção de licitações, ajustes em contratos, suspensão de processos seletivos, entre outras possibilidades.
Maiores distinções entre processos formais de denúncias e comunicações de irregularidade podem ser visualizadas na página da Ouvidoria do TCE-PI, no campo “Perguntas Frequentes”. 
Em resumo, é fundamental diferenciar denúncia de comunicação de irregularidade. A denúncia, encaminhada pelo sistema eProcesso, dá início a processo formal de fiscalização e pode ensejar sanções, razão pela qual exige a identificação do denunciante, em atendimento ao art. 5º, IV, da Constituição Federal e ao art. 96 da Lei Orgânica do TCE-PI. Já a comunicação de irregularidade corresponde a uma informação recebida pelo TCE através de qualquer dos canais de sua Ouvidoria (telefone, e-mail, WhatsApp, presencial), inclusive de forma anônima, sem, contudo, dar início de imediato a processo, mas contribuindo com as ações de fiscalização a cargo do Tribunal.
Assim, o Tribunal de Contas do Estado do Piauí reforça seu compromisso com a transparência, ao tempo em que convida a todos para que conheçam as ferramentas de fomento ao controle social dispostas no site do Tribunal (Painel de Preços Públicos, Licitações Web, Portal da Cidadania, entre diversas outras). Caso sejam identificadas irregularidades, o TCE-PI se coloca à disposição da sociedade piauiense para receber tais informações, seja mediante denúncias, seja por meio de comunicações de irregularidade”.

O que diz a lei

Na Justiça brasileira tem um entendimento claro sobre o uso de denúncias anônimas em investigações criminais. Para garantir que esse tipo de acusação não seja utilizado de forma arbitrária, os operadores do direito adotam um critério baseado na ponderação de valores. Dessa forma, o entendimento consolidado na jurisprudência determina que a denúncia anônima só será válida se a autoridade policial ou o órgão de controle (como o TCE) realizar diligências preliminares para verificar a veracidade dos fatos antes de instaurar um inquérito investigativo.

Na prática, isso significa que a polícia ou o TCE não pode abrir uma investigação apenas com base em uma denúncia sem identificação. Antes disso, é necessário que os agentes realizem apurações iniciais para confirmar se há indícios concretos que justifiquem o procedimento investigativo. Essa medida busca equilibrar o combate ao crime com a garantia de direitos fundamentais, evitando investigações infundadas ou baseadas apenas em informações não verificadas.

Ou seja, a lei permite sim o anonimato.

Fonte: Portal AZ

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