Está em curso no Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) uma auditoria para apurar a governança das contratações públicas realizadas pelo Departamento de Estradas de Rodagem do Piauí (DER-PI), órgão hoje sob o comando de Leonardo Sobral — aliado direto do senador Marcelo Castro (MDB), que, por coincidência, tem despejado recursos milionários justamente nessa estrutura.
A fiscalização, segundo a Diretoria de Fiscalização de Licitações e Contratações do TCE, tem como escopo analisar “a governança institucional aplicável aos procedimentos de contratações públicas” do DER, com atenção especial à transparência. E transparência, diga-se, é o que tem faltado.
O Ministério Público de Contas (MPC-PI) recebeu uma denúncia em que todos os documentos da Concorrência nº 15/2022 aparecem com “acesso restrito” no sistema SEI — uma licitação que resultou em contrato de R$ 59,8 milhões com a Construtora Icaraí, pertencente a Mathias Castro, filho de Humberto Castro e sobrinho do senador Marcelo Castro.
De sigilo em sigilo, asfalto vai virando negócio de família.
A denúncia foi arquivada formalmente pelo TCE, mas os fatos foram absorvidos pela auditoria já em andamento. Na prática, o Tribunal reconheceu o problema — mas ainda não tomou medida concreta.
A rede familiar de contratos
Não é de hoje que o DER-PI opera como uma espécie de “terminal de repasses” para empresas ligadas à família Castro. Em 2022, quando o órgão era comandado por José Dias de Castro Neto, filho de Marcelo, o DER firmou contrato de R$ 91 milhões com o Consórcio Transcerrados III, no qual figura a Construtora Jurema, pertencente a Humberto e João Castro — irmãos do senador.
Já em 2025, o próprio DER colocou sob sigilo contratos celebrados para a manutenção de rodovias no Território dos Carnaubais. São três licitações distintas (2018, 2022 e 2023), que, curiosamente, contratam os mesmos serviços, para os mesmos trechos, com as mesmas empresas, totalizando R$ 257,4 milhões.
A coincidência chega a ser estatisticamente cômica: em todos os três contratos, venceu a Construtora Icaraí, de Mathias Castro. Em 2023, ela operou em consórcio com a Construtora Ótima, de Humberto Castro, pai de Mathias. Nos bastidores, a disputa é em família: perdeu para eles a Soma Engenharia, do sogro do governador, e a própria Construtora Jurema, do tio João Castro.
E de onde vem o dinheiro?
Segundo matéria institucional publicada em novembro de 2023, boa parte vem de Marcelo Castro que tem garantido o Departamento Estadual, ao lado de Leonardo Sobral, R$ 260 milhões em recursos federais para as estradas do Piauí. O anúncio foi feito em tom celebratório — sem citar, no entanto, que os contratos oriundos desses recursos têm destino quase sempre previsível: os negócios da própria família.
Sob auditoria, o DER-PI caminha no escuro, com lanterna apagada e seguindo o cheiro de asfalto fresco.