Quando a crítica vira ataque: misoginia travestida de opinião

A sororidade parece não existir quando quem é vítima não reza a cartilha

Por Honorina Reis Melo,

Recentemente, a comentarista Theonia Pereira, durante participação em um programa da IELTV, fez acusações graves contra a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, insinuando que ela teria sido profissional do sexo e que membros de sua família teriam ficha criminal. A resposta veio da ativista Gessy Lima, então presidente do PL Mulher no Piauí, que classificou as falas como desrespeitosas e ressaltou como esse tipo de ataque apenas alimenta a misoginia e afasta mulheres da política.

Foto: Marcelo Casal Jr/Agência BrasilMichele Bolsonaro
Michele Bolsonaro

Independentemente da posição política de Michelle, o caso revela um padrão antigo: quando mulheres ganham destaque na esfera pública, muitas vezes são atacadas com base em sua moral, aparência ou sexualidade, e não por suas ideias ou ações concretas.

Isso geralmente pode ser feito por homens, mas mulheres também fazem parte da máquina que retroalimenta o machismo.

A pensadora feminista bell hooks escreveu que o sexismo não desaparece com o tempo: ele se adapta. E, na política, frequentemente se disfarça de “crítica”. Mas há uma diferença clara entre debater ideias e tentar destruir a imagem de uma mulher com base em insinuações sobre seu passado ou sua sexualidade. Isso não é opinião. É violência simbólica.

Quando o passado de uma mulher (e no caso uma mentira) vira arma para desacreditá-la, o que se busca não é justiça nem informação. É silenciamento. É um recado velado a outras mulheres: “Cuidado, porque, se você ousar se posicionar, vamos expor (ou inventar) algo sobre você.”

Além disso, esse tipo de conduta gera divisões entre as próprias mulheres. Em vez de se fortalecerem mutuamente, acabam se enfrentando em um terreno armado por estruturas patriarcais, onde, no fim, todas perdem. A rixa se instala, o debate se esvazia e a luta por mais representatividade feminina na política perde força. A violência simbólica não fere apenas uma mulher; ela mina o coletivo.

Nesse contexto, vale trazer a reflexão da filósofa e santa Edith Stein, no livro A Mulher Segundo sua Missão. Ela destaca que a mulher, seja no lar ou na vida pública, possui uma vocação essencial para a empatia, a dignidade, a escuta e o cuidado com o outro. Edith não entende essa missão como submissão, mas como força transformadora no mundo social e político. Para ela, a mulher tem uma missão dupla: afirmar sua identidade e, ao mesmo tempo, contribuir para a humanização das estruturas em que atua.

Esse chamado à ação com espírito de serviço, que não se submete a rótulos ideológicos, revela o quanto o espaço público precisa da mulher, não como enfeite ou alvo, mas como sujeito histórico. Quando atacamos uma mulher pública com base em sua vida privada, traímos esse princípio e negamos a vocação feminina à presença digna, forte e construtiva na sociedade.

Bell hooks dizia que o feminismo verdadeiro luta para que todas as mulheres possam existir com dignidade, liberdade e sem medo. E Edith Stein nos lembra que essa dignidade nasce também da disposição interior para servir, construir e transformar. Algo que só é possível quando se respeita o espaço e a história de cada mulher.

Debater ideias, sim. Ofender mulheres por serem mulheres, jamais.

Fonte: Portal AZ

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