Indulto humanitário salva Collor da prisão carcerária
A decisão foi respaldada por parecer técnico e jurídico e não significa extinção da pena
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou nesta quinta-feira (1º de maio), que o ex-presidente Fernando Collor de Mello, cumpra em regime domiciliar a pena de 8 anos e 10 meses imposta pela Corte, em razão de problemas de saúde. A decisão tem como fundamento o indulto humanitário, previsto no Decreto nº 9.706/2019, que estabelece critérios para a concessão do benefício a apenados em situação clínica grave ou terminal.

O indulto humanitário é uma medida excepcional do ordenamento jurídico brasileiro, voltada a garantir dignidade a pessoas privadas de liberdade que se encontram em condições de saúde incompatíveis com o cumprimento da pena em ambiente carcerário. O decreto especifica que podem ser contemplados com o benefício os presos – brasileiros ou estrangeiros – acometidos por doenças terminais, paraplegia, tetraplegia, cegueira ou enfermidades crônicas que imponham severa limitação funcional e exijam cuidados contínuos inviáveis no sistema penitenciário.
A decisão de Moraes, ao acolher o pedido da defesa de Collor, teve como base um laudo pericial oficial, atestando as limitações clínicas enfrentadas pelo ex-presidente. O documento técnico foi decisivo para a concessão do benefício, reafirmando o papel essencial da perícia médica oficial como ferramenta imparcial de garantia dos direitos fundamentais do apenado, conforme exige o decreto presidencial.
A médica Caroline Daitx, especialista em medicina legal e perícia médica, destaca que “a atuação do perito médico é um dos pilares do processo de concessão do indulto humanitário”. Segundo ela, o exame pericial segue uma metodologia técnica rigorosa, que inclui exame físico completo do apenado, com foco nas limitações funcionais; análise detalhada de laudos, exames e documentos médicos apresentados pela defesa; avaliação dos prontuários de internações hospitalares e atendimentos ambulatoriais; estudo de agravamentos clínicos e episódios de descompensação de doenças preexistentes e verificação das condições de saúde e infraestrutura médica no ambiente carcerário.
"A imparcialidade e a precisão técnica da perícia são indispensáveis para garantir que o benefício seja concedido apenas àqueles que realmente atendem aos critérios estabelecidos. É a ciência médica servindo ao Estado de Direito", pontua Daitx.
Importante salientar que o decreto exclui expressamente do benefício condenados por crimes como estupro, corrupção, tráfico de drogas, tortura, terrorismo, peculato e crimes hediondos, bem como aqueles que estejam cumprindo penas alternativas ou em suspensão condicional do processo. O indulto não representa, portanto, um perdão irrestrito, mas sim uma resposta humanitária, criteriosa e excepcional a casos que colocam em risco iminente a vida e a integridade física do preso.
No caso de Fernando Collor, a decisão de Moraes foi respaldada por parecer técnico e jurídico e não significa extinção da pena, mas sua execução sob outra forma – domiciliar – com o objetivo de garantir tratamento médico adequado e preservação de direitos fundamentais, como o direito à saúde e à vida.
O advogado criminalista Rafael Paiva, professor de Direito Penal e Processo Penal, sócio no escritório Paiva & André Sociedade de Advogados, critica duramente a decisão que autorizou Collor a cumprir a pena em regime domiciliar. “Eu confesso que recebo com uma "certa surpresa ingênua" a concessão do regime de prisão domiciliar para o ex-presidente. Em que pese haver uma certa autorização legal legislativa para concessão desse benefício, ela não deixa de ser um absurdo, um ato totalmente desproporcional e que mostra, mais uma vez, que a justiça brasileira é uma mãe quando se trata de punir corruptos, pessoas condenadas por desvio de dinheiro público e crimes que são extremamente graves.”
O especialista lembra que, segundo informações divulgadas, o presídio onde Collor cumpriria pena afirmou possuir condições adequadas para oferecer os medicamentos e cuidados de saúde necessários.“O próprio presídio informou que tem condições de fornecer os medicamentos, de tratar as eventuais doenças que ele possa ostentar. O fato da idade também não pode ser um salvo-conduto. Então veja, nós estamos dentro de uma situação onde um político corrupto com mais de 75 anos de idade se sente legitimado para praticar crimes de corrupção, mas ele não está apto a receber a represália criminal de ser preso e realmente cumprir pena”, critica Paiva.
O advogado ainda questiona a equidade do sistema penal. “Quantos e quantos outros presos no Brasil não têm idade avançada? Quantos e quantos outros presos não têm problemas de saúde, inclusive muito mais graves? É ingênua a minha surpresa, porque nós sabemos como as coisas funcionam no Brasil. Mas, em que pese haver uma justificativa jurídica, é sabido que essa justificativa só é utilizada quando há incrível interesse em privilegiar certos grupos da sociedade", conclui o penalista.
Fontes:
Caroline Daitx: médica especialista em medicina legal e perícia médica. Possui residência em Medicina Legal e Perícia Médica pela Universidade de São Paulo (USP). Atuou como médica concursada na Polícia Científica do Paraná e foi diretora científica da Associação dos Médicos Legistas do Paraná. Pós-graduada em gestão da qualidade e segurança do paciente. Atua como médica perita particular e promove cursos para médicos sobre medicina legal e perícia médica. Autora do livro “Alma da Perícia”.
Rafael Paiva: advogado criminalista, pós-graduado e mestre em Direito e professor de Direito Penal, Processo Penal, sócio no escritório Paiva & André Sociedade de Advogados.
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Fonte: M2 Comunicação Jurídica