O cheque em branco de Marcelo Castro

Senador destinou milhões para coordenadoria sem dizer ao certo para quê

Por José Ribas Neto,
Foto: Reprodução | Lula Marque | Agencia BrasileiraSenador Marcelo Castro (MDB-PI)
Senador Marcelo Castro (MDB-PI)

O senador Marcelo Castro (MDB-PI) destinou R$ 4,7 milhões em emenda parlamentar para uma coordenadoria do Piauí bancar, entre outras coisas, uma vaquejada. Até aí, nenhuma novidade — afinal, essa é uma prática comum entre senadores e deputados que usam as chamadas “emendas especiais” para enviar dinheiro diretamente aos seus redutos eleitorais.

Foto: ReproduçãoEmenda do senador do Piauí foi de quase R$ 5 milhões
Emenda do senador do Piauí foi de quase R$ 5 milhões

Mas há algo nisso tudo que salta aos olhos. Entre os valores da emenda nº 202441830007, a maior fatia, R$ 2,9 milhões, está registrada simplesmente como “recurso a ser utilizado posteriormente”. Um cheque em branco.

Foto: ReproduçãoSenador deu um “cheque em branco” de mais de R$ 2 milhões para CENDFOL
Senador deu um “cheque em branco” de mais de R$ 2 milhões para CENDFOL

Se já causa estranhamento o fato de uma emenda parlamentar federal financiar vaquejadas, uma prática que, embora tradicional, carrega um histórico de denúncias de maus-tratos aos animais, o que dizer de uma despesa pública milionária cuja finalidade declarada é… nenhuma?

Assim mesmo, preto no branco: quase três milhões de reais sem nenhuma destinação definida, sem projeto, sem plano, sem explicação.

No sistema Transferegov, onde essas emendas são registradas, o valor aparece vinculado à CENDFOL (Coordenadoria de Enfrentamento às Drogas e Fomento ao Lazer) um órgão que, ironicamente, virou especialista em receber verba sem dizer exatamente onde vai gastar.

A vaquejada

O restante da emenda também levanta questionamentos. Estão previstos R$ 200 mil para uma festa do vaqueiro em Bonfim do Piauí, R$ 299 mil para uma vaquejada no Parque Diego Hipólito Soares.

Outro ponto polêmico é o uso de verba federal para bancar vaquejadas, pois apesar de serem eventos tradicionais, mas marcados por denúncias de maus-tratos aos animais. O STF, inclusive, já declarou inconstitucional uma lei do Ceará que tentava legalizar a prática sem garantias de proteção. A emenda de Marcelo Castro financia duas dessas festas, sem qualquer menção a medidas ambientais ou de bem-estar animal.

Foto: ReproduçãoOutra parte da emenda foi destinada para vaquejadas
Outra parte da emenda foi destinada para vaquejadas

Os outros R$ 600 mil foram destinados para um curso de Libras. 

E aí menos nesses casos, sabe-se o nome dos eventos.

O problema do cheque

Para um observador atento, o problema nem é discutir se a emenda pode ou não bancar uma vaquejada, embora seja legítimo perguntar se alguém fez algum estudo sobre os impactos ambientais e sobre o bem-estar dos animais, que invariavelmente sofrem nesses eventos.

A questão central é outra: como é possível colocar milhões de reais do orçamento público federal numa rubrica vaga chamada “usar depois”?

Segundo o próprio sistema, o recurso foi classificado como “custeio”, ou seja, poderá ser usado em despesas correntes, como pagamento de serviços, aluguel, alimentação, transporte, publicidade e outras rubricas abertas. Só que, sem qualquer meta ou projeto detalhado, abre-se margem para uso arbitrário ou politicamente direcionado desses valores.

A destinação genérica fere princípios elementares da administração pública, especialmente os da finalidade e da transparência, previstos no artigo 37 da Constituição Federal. A despesa pública precisa ter objeto específico, meta mensurável e previsão clara de uso. Dinheiro público “para depois” é uma aberração contábil.

A CENDFOL

A CENDFOL, beneficiária direta de R$ 3.999.260,00, já foi alvo de outras denúncias envolvendo contratos suspeitos com recursos de emendas parlamentares — alguns, inclusive, apontados pelo Tribunal de Contas do Estado do Piauí por irregularidades. A repetição do modus operandi chama atenção: emenda robusta, sem detalhamento técnico, para uma coordenadoria com histórico de uso político e execução pouco transparente.

Fonte: Portal AZ

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