É urgente que a ideia de decolonialismo chegue ao jornalismo do Brasil

A mídia brasileira da grande importância a construção de um conceito sobre um fazer culinário que vai muito além do gosto pessoal dos votantes

Na semana passada portais de notícias e blogs foram tomados por uma lista das dez piores comidas e bebidas brasileiras, O ranqueamento foi feito pelo site TasteAtlas, plataforma criada na Bulgária por um empresário croata.

Foto: ReproduçãoCajuína
Ranquear um alimento é uma poderosa mensagem equivocada


A lista é, como se costuma dizer, mais uma entre tantas, mas a questão não está nisso. O ponto é o enorme grau de importância que a mídia brasileira dá à construção de um conceito sobre um fazer culinário que vai muito além do gosto pessoal dos votantes consultados para elaborar o ranking.
Tomemos os casos do arroz com pequi, eleito a segunda “pior” comida do Brasil e a cajuína, apontada como a terceira “pior” bebida brasileira. Em ambos os casos, uma longa tradição acompanha esses dois alimentos, há fazeres que podem ser compreendidos como patrimônio imaterial dos povos de Goiás, Minas, Tocantins e Piauí.
Ao noticiar um ranking de “piores” e “melhores” comidas e bebidas realizado a partir de consultas de opinião, sem levar em conta a ancestralidade sobre a qual se assentam os fazeres das comunidades que consumem esses alimentos, simplesmente a mídia porta-se como um colonizado que recebe e replica informações sem pô-las em xeque.
É muito urgente que o conceito de decolonialidade, presente na História, Geografia, Sociologia e Antropologia, seja apreendido pelo Jornalismo e demais formas de Comunicação Social. Simplesmente replicar uma informação produzida no que se poderia chamar de um país central é um desserviço do emissor ao receptor de uma notícia.
O caso da cajuína, que muito diz respeito ao Piauí, corrobora a ideia equivocada de que o consumo precisa ter um gosto médio, estandardizado. Cajuína que não tem açúcar, mas tons de tanino, e ruim, mas coca-cola cheia de açúcar a gás é boa.  Essa parece ser uma mensagem poderosa da indústria global de alimentos sub-repticiamente ponta nestes tipos de ranking.
Falta-nos a capacidade de compreensão de conceitos como indicação de procedência e denominação de origem local para dar mais importância aos alimentos típicos. Como determinar se algo é bom ou ruim sem considerar a ancestralidade, o conhecimento e o fazer sobre eles existentes? É simplesmente criar uma hierarquia cultural que não existe nem pode ser aceita. Nesse sentido, pois, ao olhar as notícias com decolonialidade, o jornalismo torna-se um serviço público verdadeiramente mais útil.

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