Lula – Erro jurídico anunciado
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Por Nixonn Freitas Pinheiro, advogado
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso e reduziu a pena aplicada ao ex-presidente Lula. Em primeira instância, através do ex-juiz Sérgio Moro, o ex-presidente foi condenado a mais de 9 (nove) anos de prisão. Em segunda, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a pena fixada a Lula foi aumentada para mais de 12 (doze) anos.
Agora, o STJ reduziu a pena aplicada ao ex-presidente para 8 (oito) anos e 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias no “Caso do Tríplex”. O STJ chegou ao entendimento de que houve erro na fixação e dosagem da pena aplicada ao ex-presidente, tanto em primeira como em segunda instância.
Em 13/07/2017, sob o título “Condenação de Lula e o “erro técnico-jurídico” da sentença”, publiquei aqui no Portal AZ um artigo de minha autoria sustentando que a pena continha um erro técnico e, como tal, poderia ser objeto de reexame nas instâncias superiores.
LEIA: Veja, então, o texto de 13/07/2017:
“Condenação de Lula e o “erro técnico-jurídico” da sentença”
13/07/17, 15:20
Por Nixonn Freitas Pinheiro, advogado
Na dosimetria da pena não se cogita e nem o juiz se orienta pelos critérios subjetivos, aqueles de juízo de valor. Somente pelos critérios objetivos prescritos em lei. Nada mais além! E que todos devem ser demonstrados e comprovados nos autos pela sentença, sob pena de nulidade desta.
Em 238 laudas e com 962 parágrafos de sentença, o juiz federal Sérgio Moro condenou o ex-presidente Lula a 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de reclusão pela prática dos crime de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro.
CORRUPÇÃO PASSIVA:
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
LAVAGEM DE DINHEIRO:
Lei nº 12.683, de 9 de julho de 2012, que alterou a Lei no 9.613, de 3 de março de 1998:
Art. 1º - Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
No caso técnico em exame, não nos compete aqui perquirir sobre o mérito da causa criminal. Se o ex-presidente se houve com culpa ou não. Se Lula é inocente ou não.
O objetivo do texto é examinar se a pena aplicada ao petista atendeu a técnica-jurídica. Se a dosimetria da reprimenda cumpriu os critérios e núcleos da lei penal.
No caso concreto, são duas penas: uma para corrupção passiva e outra para lavagem de dinheiro, condenação que foi aplicada cumulativamente pelo concurso material.
Assim, para cada crime há uma pena mínima: corrupção passiva, de 2 anos; e lavagem de dinheiro, de 3 anos. Se Lula tivesse sido condenado às penas mínimas, a condenação seria de apenas 5 (cinco) anos de reclusão. Neste caso, não havia necessidade do juiz justificar a decisão. Como foi acima de 9 (nove) anos, significa, claro, que o julgador saiu das penas mínimas para alterar e agravar a condenação. Por isso e de acordo com a lei obriga-se a justificá-la.
Em um primeiro momento, para o crime de corrupção passiva, Moro fixou uma pena de 5 (cinco) anos de reclusão, reduzindo-a em 6 (seis) meses pela atenuante do art. 65, inciso I, do Código Penal.
Em um segundo momento, tendo havido a prática de atos de ofício de Lula com infração do dever funcional (presidente da República), a pena por corrupção passiva foi elevada para 6 (seis) anos de reclusão. Depois, reduzida. Porém, saiu-se, em ambas as avaliações, do mínimo legal de 2 (dois) anos.
Para o crime de lavagem de dinheiro, de acordo ainda com a sentença, Moro condenou Lula a uma pena de 4 (quatro) anos de reclusão, reduzindo-a em seis meses pela atenuante do art. 65, inciso I, do Código Penal.
Por fim, levando-se em consideração que houve concurso material entre os crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, adotados os critérios, o juiz fixou a pena para o ex-presidente em 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de reclusão, reputando-a definitiva.
Como se observa, Moro escolheu uma pena acima do mínimo legal de forma aleatória para cada infração. Ou seja, não partiu do mínimo legal para escolher, primeiramente, a pena base, que é uma exigência legal, mas já iniciou com um cálculo pela metade da pena - quando deveria começar pela pena mínima para se chegar à condenação definitiva nos dois crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro.
Pelo art. 68, do Código Penal, o Brasil adotou o sistema trifásico para a fixação e a dosimetria da pena. O juiz, ao apreciar cada caso concreto para decidir sobre qual será a pena a ser imposta, obrigatoriamente passará por 3 (três) fases distintas: a primeira, em que se incumbirá de fixar a pena base; a segunda, em que fará a apuração das circunstâncias atenuantes e agravantes; e, por fim, a terceira e última fase, encarregar-se-á da aplicação das causas de aumento e de diminuição da pena para que, ao final, chegue ao total de pena em definitivo.
Um dos temas mais complexos do Direito Penal é, sem dúvida, a aplicação da pena. Quando se tratar de réu primário e de bons antecedentes, sem conduta social reprovável, família constituída, a pena base escolhida não pode iniciar-se acima do mínimo legal. Pode, sim, ser aumentada após análise das circunstâncias judiciais e das circunstâncias atenuantes e agravantes. No caso de Lula, optou-se pela metade das penas em abstrato impostas aos crimes para escolher a pena base. Cálculo esse que poderá ser considerado nulo, contrário à lei.
Com efeito, na dosimetria da pena não se cogita e nem o juiz se orienta pelos critérios subjetivos, aqueles de juízo de valor. Somente pelos critérios objetivos prescritos em lei. Nada mais além! E que todos devem ser demonstrados e comprovados nos autos pela sentença, sob pena de nulidade desta.
Para fixar a pena base, em um primeiro passo, faz-se a análise das circunstâncias atenuantes e agravantes; a análise das causas de diminuição e de aumento da pena; depois, a aferição da culpabilidade (valoração da culpa ou dolo do réu); os antecedentes criminais, a análise da vida pregressa, se o réu possui condenação anterior com trânsito em julgado; a conduta social, o relacionamento com a família, com o trabalho e com a sociedade; a personalidade, se o réu possui animosidade voltada para o crime; motivos e as circunstâncias e consequências do crime, ou seja, o modo pelo qual se deu o fato típico contrário à lei.
Salvo outro e melhor juízo, comungo da análise jurídica feita pelo professor de Direito Thiago Bottino, da Fundação Getúlio Vargas, para compreender perfeitamente que na fixação e na dosimetria da pena imposta ao ex-presidente o magistrado prolator levou em consideração critérios, além de subjetivos, alheios ao caso concreto julgado. O professor foi incisivo: “Ao fixar cinco anos de reclusão por crime de corrupção passiva, cuja pena pode variar de 2 a 12 anos de prisão, Moro argumentou que a prática se insere em um esquema de corrupção sistêmica na Petrobras, do qual o PT teria obtido R$ 16 milhões”. Ao considerar isso dentro de um contexto mais amplo, disse o professor, “em vez de se restringir ao montante que supostamente coube a Lula, Moro cometeu um ‘erro técnico’”.
O professor ainda observou que, “ao ampliar a pena pelo cargo que o condenado ocupou, Moro foi subjetivo”. E conclui com uma pergunta muito interessante e pertinente para o caso: “Se fosse governador, seria menos grave?”. Em outras palavras, quis perguntar o professor o seguinte: “Se Lula fosse governador a pena seria menor?”. Por certo, esse juízo de valor não pode comportar em uma sentença condenatória.
Para finalizar, operadores do Direito, juristas e magistrados chegaram a um consenso, o de que cumprir-se o princípio constitucional da individualização da pena é, talvez, uma das tarefas mais difíceis na aplicação do Direito Penal brasileiro. Os erros se sucedem constantemente nos juízos e tribunais, máxime em crimes complexos por concurso de pessoas e material.