Para cair, basta ruir
Para cair, basta ruir
Após a redemocratização, somente Fernando Henrique Cardoso não sofreu impeachment ou foi preso. Para não cair, transformou o Palácio do Planalto em verdadeiro “balcão de negócios”, com a maior compra aberta de votos de parlamentares no Congresso Nacional para não perder o mandato. Salvou-se pelo “gongo” como “filhote da elite”.
Acossado por denúncias que envolvem familiares por crimes no Rio de Janeiro, incomodado e falando desafiador, Bolsonaro disparou: “Venham pra cima mim, não vão me pegar”.
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Um presidente - conta Moisés Mendes - que se considerava poderoso, forte, bonito, rico e cheiroso, que tinha o apoio da elite da Avenida Paulista, dos coronéis do Nordeste, do latifúndio do Centro e do Sul, dos bancos, da Rede Globo e da imprensa em geral, arvorou-se antes da queda: “Enganam-se aqueles que pensam que vão cassar o mandato do presidente da República” (Fernando Collor de Mello).
Segundo Mendes, o ministério de Collor tinha nomes de primeira linha como Sérgio Paulo Rouanet, Adib Jatene, José Lutzenberger, Alceni Guerra, Célio Borja, Celso Lafer, Francisco Rezek, Hélio Jaguaribe, Jarbas Passarinho, José Goldemberg, Marcílio Marques Moreira, Carlos Chiarelli, Pratini de Moraes, Ozires Silva e Arthur Antunes Coimbra, o Zico. “Era um timaço, com nomes respeitados do centro e da direita. Pois o presidente com a proteção desses craques achava que eles seriam seu escudo e que ele nunca cairia. Formou um ministério de notáveis, que em tese poderiam protegê-lo. Acabou caindo como um saco de batatas, sem apoio de ninguém”.
Moisés faz uma comparação: “Bolsonaro tem um ministério medíocre, de terceira categoria, tem atritos com os militares, tem três filhos que só tumultuam (um deles envolvido em investigações com milicianos). E não tem o apoio das elites, nem da Globo, nem da imprensa. Bolsonaro tem o apoio do latifúndio, dos grileiros e da classe média reacionária que puxou sua campanha. Nem o baixo clero do Congresso o apoia. Talvez nem possa contar mais com o apoio incondicional das igrejas neopentecostais”.
Primeiro presidente eleito pelo voto direto desde 1960, Collor governou por dois anos e meio. Renunciou em meio a um processo de impeachment, que foi aprovado mesmo assim.
Collor tinha verdadeiros expoentes nacionais ao seu redor. Arrogante, senhor de si, desafiava a própria sombra! Sofrível e às duras penas, Bolsonaro tem Damares, Moro, Santos Cruz, Onyx, Heleno,... Pior: os filhos atrapalhando e Olavo de Carvalho como “incendiário” do governo. “Se quiser mesmo - vaticina Mendes - a direita pode derrubá-lo a qualquer momento, como derrubou Collor”.
"Já surgem no horizonte do governo Bolsonaro os quatro elementos de um típico impeachment latino-americano, diz o cientista político Octavio Amorim Neto. Mas ainda não se chegou lá: o presidente pode sair dessa, mas o problema é que ele não se ajuda, como complementa o analista político Rafael Cortez, da Tendências" (Fernando Dantas, em "Os tijolos do impeachment", no Estadão).
Inadvertidamente, desde o início do seu governo, Bolsonaro fez a opção errada: brigar com a grande imprensa na tentativa vã de construir uma utópica “nova política”. Uníssonos, os conservadores apostam nos motivos que podem levar à queda do atual presidente, entre eles o agravamento do escândalo da família envolvendo um filho investigado por crime de lavagem de dinheiro. Nas avaliações, o presidente comprou uma briga feita com a mídia, o Coaf e o Ministério Público.
No Brasil, nenhum governo sobreviveu apostando em relações conflituosas de relevo, especialmente com o Congresso e as instituições, partindo para o confronto para se impor. Collor foi o primeiro presidente desastrado a cair. O governo Dilma foi o primeiro desarticulado a ruir. Hoje, juntaram-se as duas situações por conexão: um presidente desastrado e um governo desarticulado. Um desastre anunciado.
Há uma questão ainda mais grave. Em uma análise clínica à distância, levando-se em conta as palavras proferidas por Bolsonaro - às vezes fora do contexto - e suas atitudes muitas das quais tresloucadas, alguns psiquiatras e psicanalistas chegaram à conclusão de que o Brasil está em perigo porque os brasileiros vivem em estado de negação e o ato falho está no poder. Quando há um aprofundamento dessa análise, o resultado é constrangedor.
Com “ranger de dentes”, fortes declarações homofóbicas, misóginas, racistas, preconceituosas e agressivas sempre partem de pessoas com problemas existenciais em decorrência de ansiedade e cansaço mental, pessimismo exagerado e quando se sentem perdidas, deixando-as fora de si.
Esses problemas levam, invariavelmente, a uma paranóia, que, segundo a literatura psiquiatra, é uma perturbação mental que se caracteriza pela tendência para uma interpretação errônea da realidade em consequência da suscetibilidade aguda e da desconfiança extrema do indivíduo, que pode chegar até ao delírio persecutório. Os delírios persecutórios são conjuntos de condições mentais nas quais as pessoas afetadas acreditam estar sendo perseguidas.
Pessoas desequilibradas têm uma tendência exagerada para xingar. Esse fenômeno comportamental-mental ocorre quando acontece alguma coisa negativa e a pessoa sente a necessidade de extravasar frustrações, trazendo para si a sensação de alívio. A Ciência mostra que o ato de xingar ou falar palavrões ajuda a aliviar a dor emocional.
Jânio Quadros era um xingador inveterado. Adorava agredir. Deixava-o aliviado. Um provocativo afeito a conflitos. Tal como Bolsonaro, também idolatrava o povo americano. E como! Em seu principal jingle de campanha eleitoral, uma passagem representou muito bem sua predileção: "O povo sabe, sabe, sabe, não se engana/ Essa vassoura é de piaçava americana/...”. Jânio não se matou, mas renunciou!