Psicopatia e Direito Penal
Psicopatia e Direito Penal
Nosso ordenamento jurídico-legal classifica o psicopata como sendo semi-imputável, sustentando pelo preceito normativo que o portador de psicopatia possui uma perturbação mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado que o torna o parcialmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com tal entendimento.
O termo "psicopatia" surgiu pela primeira vez na Escola de Psiquiatria Alemã. Coube ao psiquiatra alemão Kurt Schneider definir o indivíduo portador de perturbação mental como de uma personalidade anormal, que sofre por causa de sua anormalidade ou que, impelido por ela, causa sofrimento a outrem ou à sociedade.
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“Esse tipo de transtorno específico de personalidade é sinalizado por insensibilidade aos sentimentos alheios. Quando o grau de insensibilidade se apresenta extremado (ausência total de remorso), levando o indivíduo a uma acentuada indiferença afetiva, este pode assumir um comportamento delituoso recorrente, e o diagnóstico é de psicopatia (transtorno de personalidade antissocial, sociopatia, transtorno de caráter, transtorno sociopático ou transtorno dissocial)”, diz o magistério de Nestor Sampaio Penteado Filho, em “Manual Esquemático de Criminologia”, 2ª edição, São Paulo, Saraiva, 2012.
Adélio Bispo de Oliveira, o homem que tentou assassinar o presidente Jair Bolsonaro, remete-nos para casos históricos ocorridos no Brasil, como, por exemplo, os fatos criminosos envolvendo Pedro Rodrigues Filho, o “Pedrinho Matador”, um serial killer psicopata que matava outros criminosos por considerá-los "maus", indesejáveis para a sociedade.
Considerado inimputável, como pessoa isenta de pena, Adélio disse em juízo que tão logo saia da prisão cumprirá seu desejo: matar Bolsonaro e Temer, por considerá-los “maus” para o Brasil e partícipes de uma “conspiração maçônica” para vender nosso país aos americanos, causando-nos mais pobreza ainda.
De acordo com a Psiquiatria, é inútil tentar reeducar ou regenerar um criminoso psicopata. Porque não existe na personalidade dele o “móvel ético comportamental”. Jorge Trindade, em seu “Manual de Psicologia Jurídica”, páginas 176 e 177, aduz “não haver evidencias de que podem existir tratamentos psiquiátricos com eficiência real na redução da violência ou criminalidade contra psicopatas”.
Para o tipo criminoso, sobretudo nos casos de homicídio, sobreviver para ele é uma árdua tarefa em decorrência do estresse diário e do complexo convívio social agravado por frustrações e decepções do cotidiano. Como dizem os especialistas, tipos assim não têm “freio” na convivência humana para distinguir o bem do mal, justamente porque não têm remorso, pena e compaixão pelos outros.
De acordo com o psicólogo canadense Robert Hare, autor de "Psychology of Criminal Investigations", "International Handbook on Psychopathic Disorders and the Law" e "Snakes in Suits", ‘os psicopatas possuem ciência dos seus atos, ou seja, sabem perfeitamente que estão infringindo regras sociais e porque estão agindo dessa maneira. A deficiência deles está no campo dos afetos e das emoções. Dessa forma, tanto faz ferir, maltratar ou até matar alguém que atravesse o seu caminho ou os seus interesses’.
Resumidamente, veja o que Hare descreve sobre os psicopatas:
1 - "É enorme o sofrimento social, econômico e pessoal causado por algumas pessoas cujas atitudes e comportamento resultam menos das forças sociais do que de um senso inerente de autoridade e uma incapacidade para conexão emocional do que o resto da humanidade. Para estes indivíduos - os psicopatas - as regras sociais não são forças limitantes, e a idéia de um bem comum é meramente uma abstração confusa e inconveniente";
2 - “Eles andam pela sociedade como predadores sociais, rachando famílias, se aproveitando de pessoas vulneráveis, deixando carteiras vazias por onde passam”;
3 - “Um psicopata ama alguém da mesma forma como eu, digamos, amo meu carro – e não da forma como eu amo minha mulher. Usa o termo amor, mas não o sente da maneira como nós entendemos. Em geral, é um sentimento de posse, de propriedade. Se você perguntar a um psicopata por que ele ama certa mulher, ele lhe dará respostas muito concretas, tais como “porque ela é bonita”, “porque o sexo é ótimo” ou “porque ela está sempre lá quando preciso”. As emoções estão para o psicopata assim como está o vermelho para o daltônico. Ele simplesmente não consegue vivenciá-las”.
Para o Direito Penal brasileiro, o psicopata é tratado como sendo semi-imputável. Aquele que é portador de uma perturbação mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado que o torna parcialmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com tal entendimento.
Guilherme de Souza Nucci, em “Código Penal Comentado”, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, existem duas situações nas quais um agente pode ser considerado inimputável: 1) inimputabilidade por doença mental; e 2) inimputabilidade por maturidade natural.
Quanto à primeira situação, define o art. 26, do Código Penal brasileiro: “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento” (inimputabilidade por doença mental).
Quanto à segunda situação, reza o art. 27, do mesmo Diploma Legal: “Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial” (inimputabilidade por maturidade natural).
A questão jurídico-legal do criminoso psicopata é interessante e ao mesmo tempo complexa, porque o psicopata tem o perfeito entendimento das leis penais que regem uma sociedade. Ainda assim, planeja cuidadosamente o crime e age à sua maneira, por conveniência ou convicção. Não é propriamente um louco. Trata-se de pessoa que não levanta suspeita, sabendo controlar e simular sentimentos para conseguir se aproximar de outras pessoas, transformando a vida destas num estado lamentável e às vezes de destruição social, inclusive pela morte.
Para a Psiquiatria, como Ciência - diz a jurista Valéria Santos de Oliveira -, os criminosos psicopatas não necessariamente têm baixa capacidade intelectual. Desta forma, quando erram, cometem um ato ilícito penal, eles sabem exatamente o que estão fazendo e têm plena consciência do que é certo e errado. Porém, quanto mais ausentes do sentimento de arrependimento e sensibilidade com a vida ou patrimônio alheio, demonstram apurada habilidade em criar e manipular versões que acabam por absolvê-los de culpa, ou até mesmo em simular arrependimento.
“Grande parte de pesquisadores como Jorge Trindade, Andréa Baheregaray, Mônica Rodrigues, Robert Hare, etc., não consideram a psicopatia como uma doença mental, por não provocar qualquer sintoma em seu portador, como ocorre com as demais doenças como a esquizofrenia, psicose e etc. Os adeptos desse entendimento ainda justificam seu posicionamento sustentando que os psicopatas têm plena consciência dos seus atos e dos instrumentos necessários para alcançar seus mais sórdidos crimes. São conhecedores das normas legais e sociais e as desconsideram na prática de seus atos”, como bem pontua Michele Abreu, em suas considerações “Da Imputabilidade do Psicopata”, 2015.
Na conclusão, hoje, a psicopatia vem sendo descrita como transtorno de personalidade antissocial, encontrando-se no rol Internacional das Doenças na parte destinada para as doenças mentais. Assim, alguns doutrinadores e juristas defendem a tese de que seja considerada em sua plenitude como doença mental pelo fato de que com o decorrer do tempo a citada expressão “psicopatia” venha a ser sinônimo não só de transtorno de personalidade, mas de doença mental considerada como transtorno obsessivo-compulsivo, uma obsessão que leva a pessoa a comportamentos repetitivos e compulsivos pela frieza de uma ação ou de um ato delituoso.