Prorrogação de Mandatos
Prorrogação de Mandatos
De 16 de junho, data na qual o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgará o montante de recursos disponíveis no Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), até 5 de julho, data a partir da qual, até 4 de agosto de 2020, observado o prazo de 15 (quinze) dias que antecede a data definida pelo partido para a escolha dos candidatos em convenção, é permitido ao postulante à candidatura a cargo eletivo realizar propaganda intrapartidária com vista à indicação de seu nome, vedado o uso de rádio, televisão e outdoor, a classe política nacional viverá uma grande expectativa sobre o adiamento das eleições ou a prorrogação de mandatos dos(as) atuais prefeitos(as) e vereadores(as).
No artigo “Adiar Eleições e Constitucionalidade”, publicado aqui neste espaço, abordei a questão da viabilidade constitucional do adiamento das eleições de 2020 em um prazo proporcional e razoável que, no entendimento do futuro presidente do TSE, ministro Luis Roberto Barroso, poderá ocorrer em no máximo seis meses em virtude da pandemia do vírus, havida, para a lei, como motivo de força maior por força de um caso fortuito, uma imprevisibilidade, uma excepcionalidade.
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O tema aqui será, então, a prorrogação de mandatos. Para a lei, no caso específico, prorrogar não é o mesmo que adiar. Enquanto a primeira questão suspende as eleições de 2020 para coincidir com as eleições gerais de 2022, na segunda apenas muda a data para um prazo razoável para que a sucessão se efetive nas urnas.
Estamos diante de um fato determinado, que é a pandemia. Não só o parlamento, mas os ministros do TSE já cogitam discutir o adiamento das eleições de outubro para dezembro. Evidentemente, é uma hipótese. A decisão, no entanto, deverá ser tomada entre o fim do mês de maio e o início do mês de junho, ficando a critério das informações sanitárias prestadas pelas autoridades da saúde.
Ainda que o quadro não esteja definido, os ministros do TSE têm, no momento, descartado a possibilidade de prorrogação dos atuais mandatos. Isso aconteceria, por exemplo, para que as eleições deste ano fossem reagendadas para 2021. Ou, em último caso, programadas para uma unificação com as eleições gerais de 2022. Ao contrário do TSE, ditam-se assertivas de que a concentração de todos os pleitos em uma só data seria uma medida que se impõe para racionalizar o processo político-eleitoral brasileiro.
Sobre a influência do vírus no processo sucessório, o ministro Barroso, futuro presidente do TSE, tem uma posição até certo ponto conciliatória: “A saúde pública, a saúde da população é o bem maior a ser preservado. Por isso, no momento certo será preciso fazer uma avaliação criteriosa acerca desse tema do adiamento das eleições. Mas, nós estamos em abril. O debate ainda é precoce. Não há certeza de como a contaminação vai evoluir. Na hipótese de adiamento, ele deve ser pelo período mínimo necessário para que as eleições possam se realizar com segurança para a população”.
O magistrado tem defendido um discurso de que a ideia de prorrogação de mandatos fraudaria a soberania do voto do eleitor sufragado em 2016 para um mandato de quatro anos dos atuais eleitos nos municípios. E, por consequência, para não deixar o mesmo eleitor privado de renovar seus dirigentes locais.
Convenhamos, o TSE está diante de uma complexidade tremenda. As convenções partidárias estão agendadas para agosto. Eleições, como todos sabem, pressupõem contato entre inúmeras pessoas ao mesmo tempo e no mesmo ambiente de trabalho na busca para conquistar o voto do eleitor. Alguns até advogam que poder-se-ia realizar uma eleição de modo remoto, por videoconferência. Porém, isso não seria possível. Quebra o fundamento da cidadania sustentada no princípio do voto direto, secreto e sigiloso.
Pela sua excepcionalidade e complexidade, a questão saiu do campo da constitucionalidade e/ou inconstitucionalidade para o ambiente das alternativas jurídicas viáveis em decorrência da afetação da pandemia. Ficando exclusivamente a cargo do Congresso Nacional a decisão sobre o adiamento das eleições ou a prorrogação de mandatos. É uma competência legislativa exclusiva, que não depende da vontade ou da posição jurídica do TSE. Que poderá até influenciar, claro! Mas, convenhamos, quaisquer das alternativas será questionada na Suprema Corte.
“A alteração das regras, contudo, pode ser vista como de expressão menos dificultosa, tanto porque o Congresso Nacional pode realizá-la em regime de urgência urgentíssima, como também porque a anterioridade anual da sua vigência pode ser afastada, em razão da dramática emergência de saúde pública em que o País se acha mergulhado”, diz o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), César Asfor Rocha.
A tese da prorrogação de mandatos é uma proposta legislativa que não é nova entre nós. Observando a discussão os ministros do STF têm sublinhado que a decisão não decorrerá de uma posição meramente jurídica da Justiça Eleitoral.
Para a Suprema Corte, somente o Congresso Nacional tem o condão para aprovar uma proposta de emenda constitucional tendente a alterar “opportuno tempore” o calendário eleitoral brasileiro, especialmente para salvaguardar uma excepcionalidade sanitária com contorno e imposição jurídico-social. Portanto, não depende do TSE, mas do Congresso Nacional alterar ou não o processo político sucessório específico, como instituição garantidora constitucional, ainda que possa ser contestada e contrariada no sodalício jurisdicional.
Finalmente, há uma condicionante. Aquilo que, em Direito, estabelece condição jurídica para a realização de um ato provocado por um fato jurídico relevante. A atividade física das eleições condicionada à preservação da saúde e da vida. A condicionante aqui impõe uma obrigação, que é a pandemia impactando juridicamente na eleição. O exercício da democracia condicionado à propagação do vírus como fator extraordinário e, ao mesmo tempo, condicionante a ser observado na arena democrática como fato jurídico.
Entende-se por fato jurídico aquilo que nasce da ordem natural das coisas, sem a presença afirmativa da intervenção humana, mas que acaba produzindo efeito jurídico. É, também, um acontecimento de origem natural ou humana que ao surgir repercute juridicamente no tempo e no espaço com a função para criar, extinguir ou modificar a ordem jurídico-legal. Segundo a Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale, “o fato é elemento constitutivo do direito por si só”.