Moro x Banco dos Réus
Moro x Banco dos Réus
No Brasil, juiz e ex-juiz ser processado e, como se diz no linguajar popular, ser obrigado a sentar no banco dos réus, ainda que seja aposentado ou absolvido “a posteriori”, não é novidade alguma. Os anais estão repletos de casos envolvendo-os com malfeitos e crimes.
Não podemos negar que a imensa maioria dos juízes brasileiros são pessoas sérias e comprometidas com a função constitucional que desempenham. Justiça seja feita, diga-se de passagem.
Não deveriam errar para sentarem-se no banco dos réus. Infelizmente, a literatura mostra que pela vaidade e pela ausência de sentimentos nobres muitos se desviam em comportamentos, especialmente na busca pela fama através da toga, no encalço do poder pelo “glamour” da função e na vocação pelo fascínio da luxúria.
Como profissionais do Direito, sabemos nós que o banco dos réus é um espetáculo medieval. Nada justifica sua instituição! Ainda que de forma dissimulada! Os juízes sabem disso como ninguém, da humilhação que é alguém ser obrigado a sentar no banco dos réus.
No tema, um juiz não é um cidadão comum. Não! Assim, deve saber que não pode se inebriar com aquele ambiente formal e simbólico, com os olhares atentos que se projetam sobre si, uma atenção privilegiada para aquele com poderes quase que celestiais para julgar os comuns.
Para argumentar, na literatura jurídica moderna, no magistério dos novos tempos, o banco dos réus macula o princípio da dignidade da pessoa humana, levando-se em conta que a todos nós patrícios milita o princípio constitucional da presunção da inocência.
Jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica”, Moisés Mendes escreve sobre a possibilidade real do ex-juiz Sérgio Moro, o todo poderoso da “República de Curitiba”, algoz do ex-presidente Lula, sentar-se no banco dos réus no confronto travado com Bolsonaro.
“Vivemos para ouvir Sergio Moro dizer que o inquérito aberto por Augusto Aras é “intimidatório”.
Todos imaginamos que um dia o ex-juiz sentiria o mesmo medo dos que foram acusados por ele e submetidos às prisões preventivas intermináveis da masmorra de Curitiba.
Mas, eu nunca imaginei que seria tão cedo e que ele passasse a temer tanto os ex-parceiros.
Claro que Aras pediu autorização ao Supremo para a abertura do inquérito porque Bolsonaro quer encurralar o ex-subalterno.
Moro terá de provar (ele diz ter provas) de que Bolsonaro interferia politicamente na Polícia Federal. Ele disse mais: que Bolsonaro admitia que sua intervenção era política.
Não vai ser fácil a vida do juiz diante de um delegado, porque a acusação contra ele também é grave. Se as provas não forem aceitas, pode ser processado por denunciação caluniosa.
E aqui eu vou fazer uma previsão, porque os videntes estão na moda. Se por acaso Moro não conseguir provar o que disse, Bolsonaro vai anistiá-lo e transformar sua decisão num gesto de grandeza.
Mais adiante escreverei sobre essa previsão, sustentada pela ‘coerência’ dos Bolsonaros em defesa da liberdade de expressão, que é movida por uma lógica muito própria”.
Lembro eu que, sobre a possibilidade de Moro responder a um processo-crime, a procuradora da República Monique Cheker se insurgiu contra o procurador-geral Augusto Aras, considerando a atitude dele como uma tentativa de atacar Moro para proteger Bolsonaro. “É a primeira vez que vejo um membro do MP primeiro atacar o denunciante (sem atribuição, aliás), antes de sequer apurar devidamente os fatos narrados. É vergonhoso” – disse indignada.
Para satisfazer Bolsonaro, denuncia Cheker, Moro será investigado por Aras por supostos crimes de prevaricação, corrupção passiva (aceitar promessa ou receber vantagem indevida) e denunciação caluniosa.
Começa, então, neste 02 de maio de 2020, um “Calvário de Moro” na Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, quando será interrogado por um delegado que o auxiliou como “partícipe” nas investigações da Operação Lava Jato e que continua apurando crimes de corrupção. Será a vez do ex-juiz que tanto homologou delações fazer a sua para incriminar o ex-parceiro e “mito” Bolsonaro.
Realmente, uma situação “sui generis”. Afinal, não faz muito tempo, o ex-juiz fora alçado à condição de “herói nacional” por ter julgado e condenado políticos e empresários, ainda que por “convicção”. Agora, vê-se na obrigação de comparecer à polícia para produzir provas em seu próprio favor e se defender da afiada, insegura e imprevisível espada de Dâmocles sobre sua cabeça. Essa espada, hein! Essa espada, hein!
Surpreendentemente, o banco dos réus tanto usado por Sérgio Moro para colocar denunciados à sua frente para seus interrogatórios humilhantes e intermináveis, agora o espera indiferente, impávido e colossal em sala policial para que ele acuse o “vestal” e, pasmem, defenda-se no criminal, sob pena de ser processado e julgado como os que ele julgou e condenou naquela “República de Curitiba” infernal.