Prevaricação assusta Moro
Prevaricação assusta Moro
Na entrevista que concedeu ao Programa Fantástico do último domingo o ex-ministro Sérgio Moro mostrou-se um homem inseguro nas suas afirmações. No transcorreu da fala, perguntado por que ficou 16 meses no governo concordando com tudo e não se incomodando antes com os problemas que aponta agora, Moro demonstrou insegurança. Respondeu apenas que aceitou ser ministro por entender que “tinha uma missão”.
Moro sabe como ninguém que há uma possibilidade patente de que possa ser processado pelo crime de prevaricação. Crime funcional praticado por funcionário público contra a Administração Pública. Que consiste em retardar, deixar de praticar ou praticar indevidamente ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Moro passou 16 meses assistindo e comungando com possíveis crimes do presidente e não os denunciou ao Ministério Público Federal.
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O crime de prevaricação, previsto no art. 319, do Código Penal, não pode ser admitido na modalidade culposa. Somente na dolosa. Por que isso! Porque a pessoa que deixa ou se omite em denunciar um fato ilícito para satisfazer interesse pessoal é um comportamento tido como intencional.
Na entrevista, em síntese, observem as confissões de Moro:
- (...) “Eu não estava confortável. Eu me sentia incomodado em vários momentos. Eu estava no governo e tinha limitações do que podia externar publicamente”;
- (...) “Fui permanecendo porque eu tinha esperança de que eu ia conseguir colocar essa agenda. Mas essa interferência na PF veio num contínuo em que eu via a agenda de combate à corrupção ser cada vez mais esvaziada”. Basta!
Salvo melhor juízo, houve prevaricação tanto na modalidade “omissiva” quanto “comissiva”. Por omissão, como funcionário público, Moro deixou de fazer seu trabalho como ministro da Justiça para denunciar Bolsonaro. Por ação, intencionalmente atrasou a execução da tarefa dele agora denunciada publicamente quando se sentiu prejudicado pelo presidente e sem cargo na República brasileira.
Cientificamente, três são os elementos que integram o tipo penal da prevaricação:
- conduta para retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
- satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
- praticar contra disposição expressa em lei.
Para a caracterização da infração, basta a prova dolosa de dois dos elementos do tipo: retardar ou deixar e praticar para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
Vicente de Paula Rodrigues Maggio, mestre em Direito pelo Mackenzie e doutor em Direito Penal pela PUC-SP, diz que “o objeto jurídico do crime de prevaricação é a Administração Pública, especialmente em relação ao desenvolvimento normal e regular da atividade administrativa, prejudicada pela conduta do funcionário que não cumpre devidamente seus deveres, com a finalidade de satisfazer seu interesse ou sentimento pessoal. Objeto material é o ato de ofício, que é todo aquele (de natureza administrativa, legislativa ou judiciária) que integra a competência e atribuição do funcionário público no exercício de seu cargo ou função, indevidamente retardado ou omitido, ou praticado contra disposição expressa de lei.
Ato de ofício, segundo Cezar Bitencourt, em seu Tratado de Direito Penal, "é aquele que o funcionário público deve praticar em decorrência de seus deveres funcionais, consequentemente, segundo o tipo penal, é necessário que o sujeito ativo se encontre no exercício de suas funções regulamentares".
O tipo penal do crime de prevaricação identificado no caso Sérgio Moro encontra alicerce em três núcleos jurídicos do tipo: "retardar", "deixar de praticar" e "praticar". Retardar ato de ofício significa protelar, adiar, postergar, procrastinar indevidamente. Deixar de praticar ato de ofício significa omitir-se, indevidamente, na realização de ato que deveria executar, com o ânimo definitivo.
Como crime formal - diz Vicente Maggio -, a prevaricação se consuma sem a produção do resultado naturalístico, consistente na efetiva satisfação de interesse ou sentimento pessoal do agente. Basta o querer deliberado.
Moro confessou quando assegurou que retardou a decisão de denunciar malfeitos de Bolsonaro para interferir na Polícia Federal e em qualquer outro ministério para proteger familiares e amigos por motivos unicamente pessoais, de conveniência e de oportunidade.
Prevaricar, por fim, é o ato de trair aos deveres do cargo ou do ministério, seja por interesse próprio ou por má-fé. Assim, o ato de ofício é definido pela lei como o decorrente de um trabalho do agente público, do funcionário ou servidor que deve ser praticado pela própria natureza da função pública. Seu retardamento, sua omissão ou sua prática desvirtuada (ilegal) para satisfazer interesse ou sentimento pessoal do servidor público enseja prevaricação.