Preventiva - Prisão Ultrapassada
Preventiva - Prisão Ultrapassada
Com o advento da Lei nº 13.964/2019 (Lei Anticrime), diversos dispositivos do Código Penal (CP) e do Código de Processo Penal (CPP) - além de outras leis, como a Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal) - foram revogados, alterados ou acrescentados.
Pontualmente, significativas alterações foram impostas às chamadas prisões cautelares, mormente à prisão preventiva. A começar pelo art. 282, § 2º, do CPP. Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de decretação de prisão, seja do delegado do delegado ou do Ministério Público, determinará a intimação da parte contrária e, agora, de acordo com a nova redação legislativa, deve abrir prazo de 5 dias.
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A nova lei determina que em casos de urgência ou de perigo terá que haver justificação e fundamentação na decisão, sob pena de nulidade do decreto de prisão preventiva. Caso o juiz deixe de abrir o prazo ou deixe de justificar e fundamentar a decisão nos casos de urgentes ou de perigo, a decisão será manifestamente nula. Para tanto, a nova Lei Anticrime acrescentou o inciso V ao art. 564, do CPP, que, agora, expressamente prevê que é nula toda decisão carente de fundamentação. Antes se recorria apenas ao inciso IX, do art. 93, da Constituição Federal.
Tratando ainda do art. 282, a Lei Anticrime acrescentou no § 6º do referido dispositivo que o não cabimento de aplicação da medida cautelar em substituição à prisão preventiva deve ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes no caso concreto, de forma individualizada. Veja o texto: “§ 6º - A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada”.
No desiderato, convém ressaltar a prescrição do § 2º, do art. 313, da Lei Adjetiva Penal, que faz menção expressa de que a prisão preventiva não deve servir como meio de antecipação de cumprimento de pena ou como mera decorrência imediata de investigação criminal ou da mera apresentação ou recebimento da denúncia.
Portanto, não se considera fundamentada prisão preventiva que:
- limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
- empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
- invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão, menos a preventiva;
- não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
- limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
- deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Uma coisa é certa. De que agora é regra. O juiz ou tribunal só poderá decretar medida cautelar privativa da liberdade com observância do contraditório prévio, com prazo de 5 dias para manifestação da parte contrária. Nos casos de urgência ou de risco de ineficácia da medida, deferirá o pedido de decretação da cautelar com observação do diferido (prolongado, posposto). Exceção para os crimes contra a vida.
Para melhor compreensão, observe a redação anterior do art. 282, do CPP:
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
(...)
§ 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo.
(...)
§ 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Veja agora a redação atual do mesmo dispositivo:
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
(...)
§ 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, para se manifestar no prazo de 5 (cinco) dias, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo, e os casos de urgência ou de perigo deverão ser justificados e fundamentados em decisão que contenha elementos do caso concreto que justifiquem tal medida excepcional.
(...)
§ 6º A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada.
Veja que foram substanciais as alterações. E a prisão preventiva, hoje, é vista como cautelar ultrapassada no atual Estado de Direito.
“A prisão preventiva é a ‘ultima ratio’ do sistema cautelar, por ser a mais grave. A cautelaridade é, pois, uma condição necessária, mas não suficiente para a imposição da prisão preventiva, que exige mais: a insuficiência das demais medidas cautelares, aplicáveis cumulativamente. Tem, assim, caráter residual ou subsidiário relativamente às outras cautelares pessoais e reais” (por Paulo Queiroz, na esteira do entendimento de Aury Lopes Júnior, Alexandre Morais da Rosa e Vladimir Aras).
Inequivocamente, a gravidade do crime é uma condição necessária para o exame da viabilidade da preventiva. Porém, com a reforma, não é mais unicamente suficiente para sua decretação ou manutenção.
A reforma ao CPP deixa bastante patente que a prisão preventiva é uma espécie de última instância em relação às demais cautelares processuais penais. Porque, conforme o § 6º, do art. 282, somente será determinada a preventiva quando não houver outra que possa substitui-la para atingir a finalidade precípua da lei, observando-se, por imposição legal, as prescrições do art. 319, do Codex processual penal invocado.
A título de argumentação, considerando o princípio da isonomia e a regra do estatuída pelo art. 580, do CPP, que garante tratamento igual aos investigados/indiciados/acusados que se encontrem em situação processual idêntica ou assemelhada, a concessão de benefícios processuais de liberdade vigiada ou definitiva, a concessão de habeas corpus ou benefícios por via recursal, estender-se-ão a todos os corréus (TJ-PI – HABEAS CORPUS n. 00032870320178180000 – basta a colação da presente decisão para realçar e engrandecer a Justiça do nosso Estado).
Concluo comungando da compreensão de que o objetivo da Lei Anticrime foi aperfeiçoar o sistema acusatório. Avivando a distinção entre atores jurídicos na investigação e na Ação Penal: julgador, acusador e defensor. Sujeitos da relação processual que não se confundem. Que o julgador não acuse e nem defenda; que o acusador não julgue; e o defensor se insira no mister constitucional da ampla defesa.