Caso Alberto Silva - A Convalidação
Caso Alberto Silva - A Convalidação
No último artigo publicado aqui tratamos da questão da prescrição que fulmina de morte a recomendação ministerial para se demolir ou não o monumento que homenageia o ex-governador Alberto Silva construído na Avenida Frei Serafim, em Teresina. Agora, trataremos do princípio da convalidação do ato administrativo pelo decurso do tempo.
Apesar de parecer ou transparecer complexa, a polêmica é de fácil desate. No caso, estamos diante do princípio do fato consumado no âmbito do Direito Administrativo.
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Antes, impõe-se uma incursão à diferenciação entre o ato "nulo" e o ato "anulável".
Em Direito, o ato administrativo nulo jamais pode ou poderá ser sanado ou produzir efeitos válidos. A regra, no entanto, somente tem caráter absoluto nas relações privadas versus poder público. Nas relações públicas, evidentemente, as questões têm menor rigorismo formal. Tudo, evidentemente, em decorrência da proeminência do interesse público.
A nulidade no Direito Administrativo, segundo o magistério do renomado jurista Miguel Reale, deverá sempre seguir nas seguintes hipóteses que estejam fora desse alcance jurídico:
a) convalidação ou sanatória do ato nulo e anulável;
b) perda pela Administração do benefício da declaração unilateral de nulidade (le bénefice de préalable).
Para o jurista, mesmo que o ato administrativo tenha nascido de forma irregular, deve - como deverá - prevalecer a estabilidade das relações dentro do Direito Público, cujo ato nascido assim se convalida pelo transcurso do tempo, sempre com a ótica voltada para a preservação do interesse público e para a segurança jurídica nas variadas relações abrangentes da própria Administração Pública.
Por quê? Porque, segundo o festejado tratadista Pontes de Miranda, a desconstituição dos efeitos de um ato administrativo já concretizado há vários anos (mais de cinco) fere a razoabilidade que cristalizou a realização do ato em si, como se infere da edificação do monumento de Alberto Silva, concretamente.
Para o renomado doutrinador De Plácido e Silva, o fato consumado é aquele cujos efeitos não podem mais ser modificados. Isso porque o fato consumado no Direito Administrativo possui força convalidativa, ou até mesmo saneadora do ato nulo e/ou anulável, conforme o caso. E ainda! Porque a vida em sociedade revela a necessidade de se preservar a segurança jurídica das relações jurídicas, inclusive entre os órgãos do próprio poder público constituído, entre si ou não, como no caso específico e fustigado do Ministério Público e da Prefeitura de Teresina.
O desfazimento de um ato administrativo que já produziu efeitos após vários anos, ainda que viciado no nascedouro, afigura-se como irrazoável, desproporcional. Assim, de acordo com o bom senso, que em casos como tais deve sempre prevalecer, pela primazia da realidade e pelo fato consumado “pró tempore”, não é - e nem será - salutar que se revogue ou anule um ato convalidado pelo decurso do tempo.
A convalidação, segundo as sábias lições de Celso Antônio Bandeira de Mello, cria a estabilidade. Que não tem outro significado, outro sentido ou outra expressão lógica, senão proteger para o futuro as relações jurídicas já consumadas e que não causem prejuízos para a sociedade na relação vida, trabalho, lazer, etc.
Marcelo Caetano, jurista de escol, afirma categoricamente: "O ato doente cura-se com o decurso do tempo. E isso se dá porque o legislador pensa que a ilegalidade cometida não é tão grave que deva sobrepor-se ao interesse de pôr termo à insegurança dos direitos. Aos interessados, incluindo os representantes do interesse público, é facultado a anulação do ato, claro! Mas, se não usarem oportunamente dessa faculdade, o interesse geral impõe que não fique indefinidamente a pesar sobre este ato a ameaça de anulação”.
“Na vida social, importa que não se eternize o estado de incerteza e de luta quanto aos direitos das pessoas; por isso, consolida-se a situação criada pelo ato nascido, embora com pecado original” (STJ - Min. Cernicchiaro - REsp. nº. 136.204-RS:11A).
“No campo do Direito Público a boa-fé é o fator preponderante para manter a intangibilidade dos atos administrativos praticados em prol da coletividade, sendo irrevogável o ato que haja criado direito, mesmo que no futuro seja alterado ou revogado o comando legal instituidor do aludido direito.” (O Direito e a Vida dos Direitos, ed. RT, 3ª ed., 1991, página 32313 - Mauro Roberto Gomes de Mattos, “Compêndio de Direito Administrativo – Servidor Público”, ed. Forense, 1998, pág. 373).
Concluo trazendo uma sábia e oportuna colocação do Procurador da República e ex-juiz federal, Marcelo Santos Correa, segundo o qual "a regra geral é que a administração tem o dever de anular o ato administrativo. Entretanto, há que se reconhecer que, em certas circunstâncias especiais, poderão surgir situações que acabem por conduzir a administração a manter o ato inválido, e podem ocorrer nas seguintes situações: decurso do tempo e consolidação dos efeitos produzidos".