Enriquecimento sem Causa
Enriquecimento sem Causa
Enriquecimento ou locupletamento ilícito, também conhecido no meio forense como enriquecimento sem causa, é um acréscimo patrimonial pessoal em tão pouco tempo sem justa causa. Ou, na melhor forma de Direito, ausência “justificável” de declaração ao Fisco. Típico de países com altos índices de corrupção e fraude financeira.
Pelo magistério jurídico de César Fiúza, Frederico Pardini Neto e Bianca Oliveira de Albuquerque, a identificação do enriquecimento ilícito decorre por duas formas: a “causa eficiente” e a “causa final”.
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Pela “causa eficiente” entendem “aquilo que enseja o ato. Assim, a aquisição da propriedade de certo bem pode ter como causa eficiente um contrato de compra e venda. Aqui teríamos dois atos: a celebração do contrato e a aquisição da propriedade, o primeiro causa do segundo. Quando se fala em enriquecimento sem causa, é normalmente à causa eficiente que se está referindo. No entanto, há também a causa final. Causa final de um ato jurídico e, conseqüentemente, de um ato que enriquece, é a atribuição jurídica do ato, relacionada ao fim prático que se obtém como decorrência dele. Responde à pergunta "para que serve o ato?". Na compra e venda, por exemplo, a causa seria a transferência da propriedade. É para isso que serve esse contrato. Assim, a causa do enriquecimento do comprador foi a transferência da propriedade que ocorreu em razão de um contrato de compra e venda. Não pode ser causa de enriquecimento (aumento patrimonial) o furto ou o pagamento indevido”.
No campo estritamente privado, os juristas identificaram três requisitos para se demonstrar o enriquecimento sem causa:
1º) Diminuição patrimonial do lesado;
2º) Aumento patrimonial do beneficiado sem causa jurídica que o justifique. A falta de causa se equipara à causa que deixa de existir. Se, num primeiro momento, houve causa justa, mas esta deixou de existir, o caso será de enriquecimento indevido. O enriquecimento pode ser por aumento patrimonial, mas também por outras razões, tais como, poupar despesas, deixar de se empobrecer etc., tanto nas obrigações de dar, quanto nas de fazer e de não fazer;
3º) Relação de causalidade entre o enriquecimento de um e o empobrecimento de outro. Esteja claro, que as palavras "enriquecimento" e "empobrecimento" são usadas, aqui, em sentido figurado, ou seja, por enriquecimento entenda-se o aumento patrimonial, ainda que diminuto; por empobrecimento entenda-se a diminuição patrimonial, mesmo que ínfima.
Pelos arts. 884 a 886, o Novo Código Civil disciplina o enriquecido ou o locupletado sem causa como sendo, em princípio, “aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários".
Os tribunais, de forma uniforme, reconhecem que o fato é que o simples deslocamento de parcela patrimonial de um acervo que se empobrece para outro que se enriquece é o bastante para criar efeitos obrigacionais. No entanto, ainda segundo a remansosa jurisprudência, para que se configure o enriquecimento sem causa é necessário saber se a vantagem patrimonial foi conseguida através de um ato ilícito, de uma causa ou razão injusta.
No âmbito da Administração Pública, exemplificativamente, as dez medidas contra a corrupção, projeto de iniciativa do Ministério Público Federal brasileiro, trata a tipificação penal da conduta lastreada no enriquecimento ilícito quando criminaliza o agente criminoso que adquire, vende, empresta, aluga, recebe, cede, possui, utiliza ou usufrui, de maneira não eventual, bens, direitos ou valores cujo valor seja incompatível com os rendimentos auferidos pelo servidor público, ou por pessoa a ele equiparada, em razão de seu cargo, emprego, função pública ou mandato eletivo, ou auferidos por outro meio ilícito:”
Colhemos da Exposição de Motivos do Projeto do Novo Código Penal a assertiva de que “a criminalização do enriquecimento ilícito mostra-se como instrumento adequado para a proteção da lisura da administração pública e o patrimônio social. Não cabe ignorar que o amealhamento de patrimônio incompatível com as rendas lícitas obtidas por servidor público é indício de que houve a prática de antecedente crime contra a administração pública. Notadamente a corrupção e o peculato mostram-se caminhos prováveis para este enriquecimento sem causa. A riqueza sem causa aparente mostra-se, portanto, indício que permitirá a instauração de procedimentos formais de investigação, destinados a verificar se não houve aquisição patrimonial lícita. (...) O crime de enriquecimento ilícito, especificamente diante da corrupção administrativa, na qual corruptor e corrupto guardam interesse recíproco no sigilo dos fatos, sinaliza política criminal hábil, buscando consequências e não primórdios (a exemplo da receptação e da lavagem de dinheiro). É criminalização secundária, perfeitamente admitida em nosso direito. Vocaciona-se para dificultar a imensa e nefasta tradição de corrupção administrativa que, de acordo com índices de percepção social, nunca se deteve”.
Deve ser entendido – segundo o ensinamento de Sílvio de Salvo Venoza - como "sem causa" o ato jurídico desprovido de razão albergada pela ordem jurídica. A causa poderá existir, mas, sendo injusta, estará configurado o locupletamento indevido. O enriquecimento pode emanar tanto de ato jurídico como de negócio jurídico, e, também, como de ato de terceiro.
Concluindo, para o jurista Luiz Flávio Gomes, o enriquecimento sem causa prescinde, exatamente, de causa jurídica, sem fundamento, gerando aumento patrimonial injustificado de alguém em detrimento de outrem, seja no universo privado, seja no que circunda o interesse público.
Em tempos de corrupção aflorada, quando se denotam ações – ainda que tentadas - para se obter vantagens indevidas, a existência de normas modernas e imperativas têm que ser aliadas de uma mudança de comportamento da população, para, como consequência, o extermínio do reprovável.