Os vermes do rombo: o caos da prefeitura não tem só um culpado
Teresina enfrenta rombo de R$ 3 bilhões; responsabilidade é coletiva, não de um só gestor
A conta chegou. Teresina enfrenta um rombo estimado em mais de R$ 3 bilhões — e, como de costume, tentam de empurrar toda a culpa para um único personagem: o ex-prefeito José Pessoa Leal, o Dr. Pessoa.

Mas a história é mais suja e profunda. A verdade nua, crua e indigesta é que o buraco foi cavado a muitas mãos. Pessoa foi, sim, um gestor desastroso, errático, cercado de incompetência, desonestos e descontrole. Mas não cavou esse abismo sozinho. Foi apenas o último a escorregar dentro dele — empurrado, inclusive, por quem hoje o condena.
- Participe do nosso grupo de WhatsApp
- Participe do nosso grupo de Telegram
- Confira os jogos e classificação dos principais campeonatos
Não se trata aqui de defender Dr. Pessoa. Sua gestão foi, em diversos aspectos, um atentado à lógica administrativa. Perdeu o pulso, perdeu o rumo e, principalmente, perdeu o respeito ao cargo que ocupava.
Ele transformou a máquina pública num balcão de favores, loteou cargos a aliados de ocasião, inchou a folha com apadrinhados e entregou pastas a secretários mais preocupados com contratos do que com políticas públicas. Mas seria de uma ingenuidade — ou de uma esperteza cínica — fingir que o rombo começou com ele.
A decomposição é anterior. E muito anterior.
Basta olhar para o atual organograma da Prefeitura para ver o parasitismo institucionalizado. Os mesmos vereadores que ontem estavam nas comissões da Câmara enquanto o desastre se desenhava, hoje estão pendurados em secretarias, fundações, coordenadorias — como verdadeiras lombrigas ténias, que se entranham nas entranhas da máquina e dela se alimentam, causando infecções da máquina pública.
Há vereadores reeleitos que foram parte da base tucana, dos tempos de Firmino Filho, depois viraram base do Pessoa, e hoje se apaniguam com o novo prefeito como se fossem paladinos da renovação. Mas quem teve mandato nos últimos dez, quinze anos, e não denunciou, não fiscalizou, não cortou o cordão umbilical com a prefeitura, é cúmplice.
Cúmplice e, muitas vezes, beneficiário.
Durante as gestões tucanas, o modelo de governança que hoje desmorona já existia em versão gourmet. Com mais polidez, menos escândalo — mas com a mesma lógica de compadrio, loteamento e cabide. Vereadores e ex-secretários que hoje se fingem de chocados foram figuras centrais desse ciclo vicioso de favorecimento. Não são vítimas do sistema. São o próprio sistema.
A gestão de Dr. Pessoa apenas perdeu o verniz. Fez às claras o que antes se fazia no escuro, nos bastidores. A promiscuidade entre Executivo e Legislativo municipal nunca foi tão escancarada. Trocas de favores, emendas que viram cargos, votações compradas com nomeações — tudo isso virou moeda corrente, sem disfarce, sem pudor. A Câmara de Vereadores, ao invés de cumprir seu papel de fiscalizadora, atuou como sócia majoritária do descalabro, o atual presidente da câmara bem sabe disso.
Dr. Pessoa, com sua notória falta de preparo, virou o prefeito ideal para um sistema que precisava apenas de uma assinatura e de uma cadeira vazia. Foi marionete de um esquema que o antecede e, se Teresina não acordar, o sucederá. Não foi só um incompetente: foi instrumento. Usaram sua fragilidade, sua vaidade, sua ignorância (como só agora ele admite) e sua confusão para operar por baixo dos panos o que antes era feito com luvas brancas. E agora, com o circo desmontado, querem jogá-lo ao fogo sozinho.
Pessoa errou, inclusive ao indicar seu vice para a Secretaria de Finanças, um homem tão moral quanto pode ser um sepulcro caiado.
Teresina precisa, sim, responsabilizar Dr. Pessoa. Mas precisa ir além. Precisa cobrar cada vereador que votou sem ler, cada secretário que desviou recursos, cada assessor que enriqueceu com comissões obscuras. Precisa revisar os contratos das gestões tucanas, do Pessoa, e das que virão. Precisa tirar os parasitas da máquina pública, não apenas trocar o hospedeiro. Porque o problema não está apenas no prefeito — está em toda uma fauna política que há anos suga, saqueia e sobrevive da Prefeitura como se ela fosse um pasto particular.
Chega de panos quentes. O buraco de R$ 3 bilhões não foi feito por um só homem. Foi escavado por uma cidade inteira de omissos, oportunistas e profissionais do saque institucional. E se nada mudar, prepare-se.
Fonte: Portal AZ