A farsa no caso Arimatéia Azevedo

A farsa no caso Arimatéia Azevedo

Li com atenção o inquérito que redundou na prisão preventiva do jornalista Arimatéia Azevedo. E, "a priori", sem que o jornalista tenha mantido qualquer contato ou diálogo com a suposta vítima.

Jornalista Arimatéia Azevedo segue preso na penitenciária Irmão Guido (Foto: Portal AZ)

O caso Arimatéia Azevedo mais recente obriga o profissional do Direito a usar da hermenêutica jurídica mais contemporânea, que, segundo os juristas e professores Rafael Tomaz de Oliveira e Lenio Luiz Streck, representa algo maior do que simplesmente um repositório de métodos para auxiliar o intérprete em sua tarefa de compreensão do direito. Trata-se de verdadeira filosofia e, portanto, não de uma disciplina acessória, mas sim fundante e, em termos gadamerianos, vinculadas à própria existência e sua vinculação com a linguagem.

O caso se assemelha à "máxima negativa" inserta ao Direito Penal para caracterizar o chamado "crime impossível", também cunhado na linguagem forense inidôneo, inútil, inadequado,... "O jornalista teria atirado em um cadáver para matar!" 

Ora, se Arimatéia Azevedo não manteve sequer entendimento direto com a suposta vítima, como, então, ter cometido ou tentado cometer extorsão?

Aqui reside a hermenêutica. Vamos, então, ao palpitante tema jurídico.

A sabedoria forense nacional tem conhecimento uniforme de que o crime de extorsão é assemelhado ao de roubo. A diferença é que no roubo não importa a cooperação da vítima. É executado independentemente da contribuição (ainda que forçada) da vítima. Na extorsão o crime somente será concretizado se a vítima contribuir para a subtração da coisa, do objeto. Aqui a vitima é forçada a fazer algo que não quer fazer (ou deixar de fazer algo que quer fazer), haja vista que o autor da infração a está ameaçando ou porque a está, de alguma forma, violentando-a.

O roubo poderá ocorrer sem qualquer contato com a vítima. Na extorsão, ao contrário, é necessária a participação do "criminoso e da vítima", simultaneamente, sem o qual não haverá sequer crime tentado de extorsão.

O caso Arimatéia Azevedo, induvidosamente, leva o intérprete a compreender que estamos diante de uma ação delitiva absolutamente inidônea. Porque em momento algum na investigação tem-se notícia de que o jornalista "forçou a suposta vítima a fazer algo contra a vontade dela ou para que esta não fizesse o que desejaria. Ou seja, obrigá-la a "aceitar" a extorsão de forma direta.

Ora, sabem também os doutos, que haverá "crime possível" se o objeto for idôneo. Se o jornalista não manteve contato com a vítima o meio é inidôneo. Porque só haverá crime de extorsão se tiver a participação da vítima para atender à ação direta do criminoso.

No reconhecimento do "crime possível" - sabem os bons profissionais do Direito - é necessário que o meio seja inteiramente eficaz para a obtenção do resultado. Assim, há inidoneidade do objeto quando o indiciado (ou acusado) e vítima sequer mantiveram contato para a tentativa ou a consumação da infração.

E não se venha dizer que o crime teria ocorrido através de um terceiro ou intermediário. Não é assim! Aliás, isso reforça e ratifica cada vez mais a tese do "crime impossível", dado que a extorsão é jungida por ação direta do delinquente e exige dupla participação: acusado e vítima. Sem a participação direta de ambos não haverá crime!

O caso Arimatéia Azevedo é, portanto, impróprio para caracterizar essa "arrumada" extorsão. Verdade! É como alguém querer usar um palito de dente para matar outrem; ou o “corno” arremessar um travesseiro de plumas para causar lesão grave na amante!

"Data máxima venia", se não for uma "farsa", assemelha-se muito!

Por Miguel Dias, advogado 

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